Quando tudo se resume a comer para esquecer
Durante anos eu debati-me muito com o acto de comer. Durante muitos, muitos anos mesmo, comer nunca foi uma coisa fácil ou tranquila para mim. Ou melhor era tranquilo, enquanto andava focada na dieta que estava a fazer, mas assim que a coisa descambava, comer tornava-se acima de tudo uma forma que eu encontrava para descarregar frustrações.
A verdade é que sempre criei grandes expectativas na minha forma física e no como eu me iria sentir quando alcançasse os padrões de beleza que eu imaginava na minha cabeça. E na maioria das vezes sempre que isso não acontecia eu comia. Eu comia muito. Comia até ficar mal disposta e até ficar a sentir-me muito mal comigo mesma.
Costumo dizer que comia muitas vezes para esquecer.
Acima de tudo para tentar esquecer que vivia num corpo que eu odiava e do qual me queria libertar. Ou então porque quando perdia peso nunca chegava. É verdade que eu tive excesso de peso e odiava-me por isso. Odiava ter umas calças 44 e 46. Odiava que me tirassem fotografias na praia e odiava ir a lojas e ter de enfrentar o espelho. E a forma que sempre encontrei para combater estes meus ódios era comer. Porque comer durante muito tempo deu-me um conforto que mais ninguém conseguia dar.
Quem me conhece sabe que eu tenho muita dificuldade em expressar-me falando. Hoje em dia uso a escrita para libertar os meus demónios, mas no passado eu usava a comida. Era a minha forma de deitar cá para fora as minhas dores. Comendo para esquecer. E foi exactamente por passar tantos anos a comer desta forma que durante anos e anos eu esqueci-me do que era comer com amor e prazer. Comer acima de tudo sem medo.
Comer era para mim ou um acto de punição
Com restrições gigantes ou um acto completamente louco e descontrolado onde tudo o que conseguia comer eu comia. Durante muito tempo eu nunca consegui olhar para a comida como uma coisa normal e equilibrada. As férias por exemplo para mim, sempre significaram descontrolo total. Fossem férias grandes ou um fim-de-semana prolongado eu sempre tive muita dificuldade em encarar estes momentos em que não tenho “obrigação” de preparar marmitas com normalidade. É óbvio que as férias são sinónimo de relaxar. Mas no meu caso estar de férias sempre significou comer tudo de forma totalmente descontrolada. Com a desculpa que estava de férias.
E no fundo eu olho para a minha relação com a comida e percebo que tudo sempre se baseou em dar desculpas. Desculpas que estava em baixo porque o dia me tinha corrido mal. Ou porque a dieta não estava a andar tão depressa como eu queria. Ou porque a minha barriga não tinha secado como eu queria. Ou simplesmente porque estava de férias, ou era sexta-feira. Desculpas e mais desculpas que eu arranjava como forma de poder esquecer tudo aquilo que me incomodava.
E este é um dos meus maiores medos sabem.
Voltar a ter esta relação doentia com a comida, por não conseguir lidar com as minhas emoções. Eu tenho total noção que estou muito, mas muito longe de onde já estive, que hoje em dia a forma como eu entendo a comida pode considerar-se saudável. Mas eu digo várias vezes a todas as pessoas que me pedem ajuda para lidar com compulsões, que isto é um trabalho para a vida toda. E que por mais dicas que eu dê, as pessoas precisam de aceitar que deslizes acontecem e é importante perceber que somos nós que escolhemos ceder a eles.
Porque no fim de contas ninguém nos está a meter a comida na boca. Somos nós que escolhemos comer para esquecer. Somos nós que escolhemos combater as nossas emoções com comida. E por isso também somos nós que temos o poder de dizer basta. Mesmo que isso signifique dizê-lo todos os dias da nossa vida para que nunca nos esqueçamos porque estamos realmente a comer.
Claudia Mulher XL
Adorei este relato sincero e genuíno. O comer emocional é um problema, mesmo. E muitas vezes acham que simplesmente comemos muito porque sim, por desleixo. Pode ser e pode não ser. É algo muito complexo. Quando utilizamos a comida como conforto emocional e aumentamos muito de peso, podemos entrar no processo reverso: de repente toda a comida é má e tudo o que metemos à boca é diabólico. Então deixamos de comer ou comemos muito pouco. Isso também não é bom. A saúde não tem de ter a ver com peso. Podemos ser gordinhas e gostar de nós e comer normalmente e praticar exercício e simplesmente viver normalmente. O problema está sempre nos excessos e nas faltas de equilíbrio!
vânia duarte
Claudia Mulher XLsem dúvida concordo com tudo 🙂 saúde é muito mais do que peso, é ter consciência do impacto das nossas decisões e acima de tudo não ter medo de comer. beijinhos