Diz-me, quanto pesa a tua felicidade?
Durante os 15 anos que quis emagrecer, fui obcecada com o número 50. E acaba por ser engraçado, porque efectivamente hoje em dia é um número que gosto bastante. Mas até há 2 anos, a minha felicidade dependia de chegar a este número na balança.
Como já vos contei, em miúda tive excesso de peso. Estive muito perto dos 80. Vesti um 46-48 e não usava calções curtos, saias ou vestidos. Na verdade durante muitos anos, acabei por esconder o meu corpo em roupas bastante largas e o Verão era a pior época da minha vida.
Quando comecei a querer emagrecer e a vomitar para o conseguir meti um número na minha cabeça.
Queria desesperadamente chegar aos 60 quilos, porque só com aquele número é que eu tinha a certeza que seria verdadeiramente feliz. Consegui sabes? Fiz muitas dietas palermas para conseguir este número. Vomitei grande parte desses quilos mas consegui chegar finalmente aos 60 kilos. E quando lá cheguei não gostei do que vi e chorei. Quis perder mais.
Estipulei então uma nova meta. Dessa vez não tão grande. Queria chegar aos 55 quilos. A verdade é que, o número 50 para mim, sempre me pareceu muito longínquo e somente atingível por modelos. Mas agora que estava ali com os meus 60 quilos, chegar aos 55 já não me parecia tão complicado. Voltei às restrições. A comer muito pouco. E cheguei ao peso que estipulei. Quando me olhei ao espelho chorei.
Voltei a estipular um novo peso. E desta vez, defini esta meta como final.
Acreditava profundamente que só os 50 quilos me dariam o corpo perfeito que eu tanto procurava e consequentemente a verdadeira felicidade. Eu acreditava mesmo nisto sabes? Acreditava genuinamente que a minha felicidade estava mesmo relacionada com o número que iria surgir na balança. E que acima de tudo, eu não era feliz por minha culpa. Porque não era mesmo focada. Porque às vezes me rendia às compulsões em vez de me manter no plano. Porque devia treinar mais. Porque devia esforçar-me muito mais, do que me esforçava.
Em 2014 quando me foi oficialmente diagnosticado síndrome do pânico eu estava a pesar 47 quilos. A minha cara era de uma pessoa doente. Magra muito magra e sem cor. Todas as pessoas que me viam fossem família ou amigos sabiam que eu estava mesmo doente. Em mim, instalou-se uma grande depressão, ataques de pânico muito graves que me paralisavam a cara e o braço esquerdo e uma grande disfunção de imagem corporal.
Lembro-me que um dia a minha psicóloga
Pediu para desenhar numa folha de papel em branco bastante grande, como é que eu achava que era. Desenhei um corpo muito, muito maior do que o meu. Na verdade desenhei o corpo que eu já tivera há muitos anos atrás. Depois, ela pediu para me deitar, e com a caneta contornou todo o meu corpo. O resultado foi um choque: o meu corpo contornado por ela, era mais de metade do que aquele que eu tinha desenhado. E foi exactamente aqui que percebi que tinha uma imagem corporal completamente distorcida e assumi que precisava de ajuda.
Em 2016 quando voltei a ficar doente por causa daquela dieta idiota que fiz.
Já não pesava 47 quilos é verdade. Pesava 53. Mas achava-me gorda. Horrível. Tinha começado o ano muito decidida. Seria o ano da minha verdadeira mudança. Queria a todo o custo alcançar o corpo perfeito e para isso tinha de pesar 50 quilos.
Como já te contei, eu consegui chegar aos 50 quilos, e consegui acima de tudo alcançar o corpo com que sonhei. E nunca fui tão infeliz. Porque manter aquele peso era uma tortura para mim. Porque tinha medo de comer sem pesar tudo. Porque tinha medo de ir jantar fora. Porque comia sempre a mesma coisa. Porque estava fisicamente e emocionalmente esgotada e acima de tudo, porque apesar de todos os elogios que recebia no Instagram, eu continuava a ver-me exactamente da mesma forma. E então eu comia. Comia porque me sentia frustrada. Comia para acalmar a minha dor. Comia porque era aquilo que eu melhor sabia fazer quando me sentia em baixo.
E voltava a engordar. Sentia-me horrível e prometia a mim mesma que ia voltar ao foco.
Que ia chegar aos 50 quilos e ser feliz. E de repente apagava-se da minha memória que ao longo destes 15 anos eu já tinha estado nos 50 quilos várias vezes e não tinha sido feliz. Nem nos 49, nos 48 ou 47 ?
Porque o corpo que eu imaginava que teria com aquele peso, era muito diferente do que aquele que eu realmente tinha. Primeiro porque a minha imagem corporal sempre esteve distorcida, eu sempre me vi muito mais gorda do estava na realidade fosse com que peso fosse. E segundo, porque eu nunca teria umas ancas finas – o meu sonho – a menos que as cortasse. Mas na minha cabeça, os 50 quilos dar-me-iam estas ancas. Afinal de contas as inspirações da internet em que me baseava tinham este peso e estas ancas perfeitas. Por isso, só podia haver alguma coisa de errado comigo, para não conseguir isto. E punia-me. Porque na minha cabeça eu não era assim, porque falhava.
Há uns tempos atrás recebi uma mensagem aqui no blogue a perguntar porque é que eu dizia que ter 80 quilos era mau. Essa pessoa dizia, que ter 80 quilos dependendo da altura poderia ser um peso normal e que era muito mau, dizer-se que só a magreza é que traz felicidade. Na verdade, concordo muito com esta parte, mas não concordo com a primeira parte.
Quem me segue sabe, que os meus 80 quilos existiram, fruto de má alimentação.
Eu comia muitos doces. Muita fast-food e bebia muitos refrigerantes. Os meus 80 quilos era maus, porque não eram minimamente saudáveis. Porque tenho 1.64m e se tivesse escolhido continuar assim, hoje em dia teria de certeza diabetes e colesterol alto. Para além disso, naquela época, ter este peso não me permitia fazer as aulas de ginástica e eu sofria muito com isso. Foi um peso que se tornou o ponto de partida para sofrer de bullying e consequentemente de bulimia. Por isso, sim para mim os 80 quilos que eu tive foram maus, não pelo número em si, mas por toda a carga emocional que me fizeram carregar durante anos.
Mas como digo sempre, sim eu fui infeliz com 80 quilo, mas também o fui com 50 e com menos. E é por isso que quando vejo por essa internet fora, pessoas a pedirem dicas milagrosas para perda de peso e a assumirem que precisam de chegar a determinado número para serem felizes, apetece-me gritar bem alto: Não, não vais.
Nem com esse peso nem com menos.
Porque o problema é muito mais fundo do que um simples número na balança. O problema é efectivamente interior e enquanto não o curares não será esse peso que te vai fazer mudar. A verdade, é que a maioria das pessoas que ambiciona um número provavelmente até já o teve.
- Quantas pessoas conhecemos nós, que fazem dietas, perdem peso, chegam ao número que querem e quando lá estão, sentem-se insatisfeitas? E dizem que talvez se perdessem mais um ou dois seria melhor?
- Quantas pessoas conhecemos nós, que chegam aos números estipulados, deixam de se preocupar com a alimentação, engordam e voltam a prometer que precisam de chegar aquele número novamente?
O que acontece na maior parte dos casos de infelicidade com as dietas.
É que as pessoas mais do que terem um número na cabeça, têm um tipo de corpo na cabeça. E acham que só aquele número, lhes dará o corpo que sempre sonharam. Eu passei exactamente por isto.
O problema é que muitas vezes, os corpos que vemos espalhados por essa internet fora e que assumimos como perfeitos, são assim porque sofreram alguma intervenção estética, mas que não contam aos seus seguidores – eu conheço uma pessoa que o fez e não conta. Ou então, pura e simplesmente não estão assim tão felizes como fazem parecer ser. E encontram-se exactamente no mesmo ponto do que tu: à procura do corpo ideal. Como sabes, eu também já mostrei que estava feliz e contente com o meu corpo quando na realidade me sentia uma nulidade.
Não há mal nenhum em querer melhorar.
Em querer perder ou ganhar peso para nos sentirmos mais confortáveis. O mal está em criares na tua cabeça, objectivos baseados no que vês nas outras pessoas. O mal está em fazeres isto para mostrares o corpo perfeito aos outros na praia e não por ti.
Hoje em dia peso 57 kilos. Pesei-me de propósito para fazer este post, porque é algo que não faço durante meses. Normalmente ando entre os 55 e os 57. E não faço a mínima de quanto tenho de massa gorda nem de massa magra. E se queres saber? Estou super OK com isto. Porque foi quando deixei de seguir números para seguir a minha intuição e conseguir discernir perante um espelho se estou confortável com este corpo ou não, que efectivamente me tornei uma pessoa em paz com a balança.
E é por isso que te garanto com toda a certeza, que enquanto baseares a tua felicidade num número, nunca serás verdadeiramente feliz.
Ana Beatriz Pereira Martins
Adorei ler a tua reflexão, e é bem verdade quando ficamos obcecadas nunca chegamos a ser verdadeiramente felizes!!
Beijinhos ♥
Carolina Franco
Concordei com cada palavra. Sempre reflito imenso com os teus posts. Daí eu gostar mais de reeducação alimentar a dietas, pois as dietas são mais com números. Como por exemplo, durante 6 meses farei uma dieta restrita à base de plantas e vegetais e perderei 20 quilos. Após os 6 meses já não terei aqueles 20kg e sentirei-me vitoriosa mas passado esses meses, voltarei a ganhar esse peso perdido e mais algum, pois as pessoas sempre pensam que fazem durante uns meses dieta e os quilos mantém-se sempre. Eu não me pesei, nem antes da reeducação e não pretendo pesar-me nem tão cedo. Pretendo somente pesar-me daqui a uns meses, quando completar 6 meses de reeducação alimentar. Ainda peco muitas vezes e estou tentando fazer as coisas com calma de forma a não desistir. Até agora tem sido tranquilo e ainda bem. Beijinhos <3
Claudia - Mulher XL
És um exemplo de inspiração!
Gostaria de te convidar para um guest post no nosso blog Mulher XL, se estiveres interessada 🙂
contacta-nos: mulher.xl.pt@gmail.com
beijinho
Carolayne Ramos
E pensava eu que não havia mais pessoal por aqui com problemas de peso? 😮 No dia a dia, parece sempre tudo tão perfeito e direitinho, que por vezes quem está deste lado, não se consegue identificar com nada!
Felizmente, nunca tive distúrbios alimentares, mas o meu peso e o meu corpo sempre foram os meus grandes problemas. Admito que já estive bem pior do que na atualidade, grande parte porque conheci muita gente que me ajudou indiretamente a superar os meus complexos e a amar-me, afinal, se eles gostam de mim, porque é que eu haveria de ser diferente?
Tenho tentado quebrar as minhas inseguranças, treinando e me alimentado de maneira consciente, sem quaisquer medos, pois, para além de prezar a minha saúde mental, é tal como afirmas: quando deixamos os números e os tipos de lado, a nossa percepção muda drasticamente e passamos a valorizar imenso a pessoa que somos!
Muito obrigada por esta partilha, de verdade! Não esperava encontrar este tipo de texto, mas veio mesmo a calhar!
Beijinhos!