Até parece mentira
Que me olho ao espelho e gosto do que vejo;
Que não tenho medo de um jantar de amigos;
Que não peso cada grama que ingiro para atingir valores matemáticos, porque só assim é que iria conseguir ter o corpo de sonho, mesmo que me custasse a sanidade mental;
Que não vomito a comida e a alma, na esperança que a gordura se fosse também;
Que não sonho acordar sendo outra pessoa noutro corpo;
Que não espero estar uma top model daqui a 6 meses;
Que não chego ao final do ano a prometer que o ano seguinte será o tal;
Que não como às escondidas com vergonha que me vejam num total descontrolo alimentar;
Que aceito que há dias menos bons e que aprender a lidar com eles faz parte deste caminho de aceitação pessoal.
Até parece mentira mas tudo isto tornou-se em verdade. Na minha mais pura e genuína verdade.
Perguntam-me muitas vezes como se alcança equilíbrio alimentar. Eu não tenho uma resposta certa, há tantos factores que influenciam o chegar a este estado, que algumas vezes eu ainda me belisco para acreditar que sim, cheguei aqui. Talvez seja o medo de abrir os olhos e perceber que estou a sonhar, ou talvez seja a minha veia natural de auto-boicote a querer mostrar-me que não sou merecedora disto.
E caramba se não me tento boicotar tantas e tantas vezes. Mas há algo que me continua a puxar para a tona, quase como se fosse uma força extra que viesse até mim, e que me diz dia após dia que o meu lugar e o do meu corpo são aqui, neste lado da linha onde a tranquilidade com a minha imagem corporal existe. E estar aqui é bom. Garanto-vos que sim. Mas eu sei o caminho duro que fiz até cá chegar e é por isso que dia após dia eu vivo a minha verdade e é sobre ela que escrevo.
Porque passei anos a desejar esta verdade, sem ter a coragem suficiente para enfrentar o que era preciso para a ter por inteiro. Vivi anos a sonhar com uma verdade, mas a desistir de a tornar realidade ao mínimo percalço. Porque era fraca, dizia eu. No entanto aquilo que a vida me mostrou é que eu acomodei-me à minha doença, à minha compulsão.
Eu acomodei-me a viver entre o 8 ou o 80, porque era mais fácil estar assim do que assumir que tinha de agarrar no meu problema com as mãos, os pés, a cabeça e todo e qualquer pedaço do meu corpo e enfrenta-lo. São precisos anos para isto sabem.
E mais do que anos, é preciso aceitar que nenhum guru vos vai curar se vocês não quiserem.
E não basta dizer com a boca eu quero curar-me. Porque eu disse-o muitas vezes. Demasiadas ao longo de 15 anos. É preciso dizer com a alma, é preciso que deixes o teu corpo espiritual gritar bem alto, para que se faça ouvir na tua cabeça e no teu coração. Só aí, quando esse pedido de cura vier realmente do mais profundo do teu ser é que se abrem as portas para a tua descoberta pessoal. E é nesse exacto momento que a tua verdade se faz ouvir em plenos pulmões.
Até parece mentira que estou hoje, a escrever este texto em plena consciência que eu, venci uma doença que deu cabo de grande parte da minha vida adolescente e adulta, até parece mentira mas é verdade. E se eu consegui tu também o consegues. Porque a única coisa que nos separa foi um dia, eu ter decidido mudar para sempre. Sem volta