Temos mesmo de nos aceitar como somos?
Isto de nos aceitar como somos tem muito que se lhe diga. Especialmente numa época em que se fala de amor próprio em qualquer esquina. E eu acho isto incrível, o olhar para o nosso corpo com olhos de amor, com menos autocrítica, mas como em tudo há um mas, isto não significa que desejares mudar não seja importante.
Quando eu tive 75quilos se alguém me dissesse: “Aceita-te como és. Ama-te acima de tudo” – eu ia mandar a pessoa literalmente à merda. Da mesma forma que o faria quando cheguei aos 47. E sim, eu sei que há pessoas com mais peso que são felizes, mas eu não era. Da mesma forma que quando tive pouco também não o fui. E por isso, quando se fala sobre isto da aceitação corporal, é importante perceber que há alturas em que efectivamente a maior prova de amor que podes ter para contigo é quereres largar um corpo que não te identifica e procurares fazer um upgrade físico e emocional ao que tens.
Quando eu tive excesso de peso eu odiava-me.
Não há uma melhor forma de vos dizer isto. Eu odiava a minha barriga, odiava as minhas ancas e odiava a celulite que comecei a desenvolver aos 13 anos. E este ódio que eu tinha para com o meu corpo reflectia-se na forma como eu me comparava constantemente com as minhas amigas e com as minhas muitas mudanças de humor ao longo de muito tempo.
Ora eu decidi durante anos fazer dietas. Tomar poções mágicas para emagrecer sempre com a justificação mental que estava a tomar uma decisão de amor por mim. Mas não estava. Estava a tomar uma decisão por ódio. Por ódio de um corpo com o qual eu não me identificava quando me olhava ao espelho.
Agora, é verdade que nem tudo se resume ao peso.
É verdade que muitas das pessoas que lutam com a balança, lutam acima de tudo com a cabeça e é exactamente essa que muitas vezes precisa de uma verdadeira intervenção de amor próprio. Em 2016 eu decidi mudar para sempre, quando voltei a bater no fundo aos 30 anos. E nessa altura eu já não tinha 75 quilos mas sim 51 e era extremamente infeliz. Nessa época eu percebi efectivamente que para me amar eu tinha de acabar com o meu comportamento obsessivo com a comida e com o peso e foi aqui que tomei a decisão de me amar por inteiro, ao assumir que tinha um problema e precisava de o tratar. Isto sim foi verdadeiro amor próprio.
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E importante perceber isto, porque eu acho que há uma grande confusão nesta coisa de aceitar como somos, versus procurar o melhor para nós – mesmo que isso implique mudança. Porque a aceitação corporal é muito bonita quando tu estás em paz contigo a maior parte do tempo – pois não vale esquecer que ninguém, absolutamente ninguém se ama todos os dias. Ora, eu não posso pedir a alguém que se ame profundamente quando a sua cabeça não lhe diz isso. E é exactamente este ponto que precisa de ser tratado – a percepção corporal que nada tem a ver com aceitar como somos, mas sim com fazer-te ver quando tens razão ou quando estás a entrar em obsessão.
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Diz-se muito por aí que todos os corpos são lindos.
E sim eu consigo entender essa frase. Mas todos os corpos são lindos, quando a pessoa que está nele o consegue ver desta forma entendem? Não serve de muito vir alguém gritar “ama-te profundamente”, quando interiormente tu não te sentes assim. E esconder estes sentimentos, camuflar aquilo que verdadeiramente sentes é meio caminho para graves distúrbios alimentares. E acima de tudo, não é real. Nós somos humanos. A raiva, a angústia e a tristeza compõem-nos enquanto seres sencientes.
A aceitação corporal é muito mais do que te identificares com o corpo que tens hoje.
Aceitação corporal é também admitir que aquela forma que tens hoje, seja ela de muito peso ou de pouco não te completa e para te amares precisas de mudar. Mas mudar com consciência e com saúde. Mudar por ti, sem te agarrares a utopias de fotografias que vês na internet. E querer mudar é amor próprio. Querer procurar um caminho que não é aquele que conheces é amor próprio.
Por isso não tenhas medo de o fazer. Mas lembra-te sempre que uma mudança para sempre só acontece quando as motivações são as certas. A minha foi encontrar paz alimentar. A tua pode ser outra coisa qualquer desde que no fim saibas que o estás a fazer por ti.
Carolina Madeira
Nem sei o quanto este texto me bateu cá dentro. Juro que há alturas que me sinto idiota quando vejo as pessoas a proclamarem o gosta de ti como és e eu só quero perder o peso que ganhei na gravidez sem me sentir fútil ou ingrata. Sou muito feliz pela vida que tenho, pela minha vida, mas porra não não gosto de mim como estou agora e não pode haver mal em admitir isto mesmo que existam pessoas em situações piores. A sério Vânia obrigada por escreveres desta forma, obrigada pela lucidez que trazes a este mundo digital, obrigada por seres de carne e osso.