15 anos a querer trocar de corpo
Há uma coisa engraçada nisto de reeducarmos a cabeça. É a forma como as coisas mexem connosco quando acontecem. Durante anos eu quis ser magra. Verdadeiramente magra, daquelas de revista.
Quando tinha 16 anos e comecei a vomitar queria ser como a Britney Spears. Era o meu ídolo na altura. E era no corpo dela que pensava sempre que comia demasiado e mandava tudo cá para fora a seguir. Magra e bonita era tudo o que eu queria ser naquela altura, porque era tudo o que eu não era.
Conforme os anos foram passando, a Britney deixou de estar no meu radar, mas eu não deixei de querer ter outro corpo. Especialmente quando chegava o Verão e tinha de me expor na praia. Para mim ir à praia sempre foi muito doloroso. Tirar fotografias ainda pior, e essa é a razão porque tenho pouquíssimas fotos entre os 16 e os 30 anos na praia. Porque aquele corpo que eu tinha, sempre foi demasiado imperfeito aos meus olhos para ser gravado eternamente numa fotografia.
Passei muitos verões na praia a olhar para os corpos de outras mulheres.
A desejar ter aquelas ancas finas e aquela barriga seca. Passei muitos verões a esconder a minha barriga numa t-shirt ou numa toalha, porque tinha pavor que ao sentar-me na areia se vissem as minhas dobras na barriga. E durante o tempo que estava na praia fazia promessas mentais de que no próximo ano eu estaria com o meu corpo de sonho.
Foram 15 anos a fazer a mesma promessa. Que no ano a seguir teria outro corpo, um corpo incrível do qual me orgulhasse. Com o passar dos anos, entre lidar com a minha doença e as muitas dietas que fiz, eu perdi bastante peso. Perdi uma quantidade de peso digna de me deixar bastante orgulhosa. Mas quanto mais peso perdia menos gostava do meu corpo. O excesso de peso deu lugar a estrias e a celulite que marcaram para sempre este corpo, como forma de eu nunca me esquecer onde já estive.
Demorei muitos anos a entender isto, que estas marcas de guerra contam uma história muito poderosa.
E que mais do que desejar outro corpo eu preciso de honrar este que tenho. Porque foi um forte durante 15 anos. Porque aguentou vómitos, dietas loucas, aumentos e perdas de peso constantes. Aguentou muitas compulsões, aguentou ser apertado em roupa que não lhe servia com a promessa que no próximo ano iria servir. Aguentou ser enrolado em papel aderente para suar mais. Aguentou ser besuntado em mil e um cremes que prometiam verdadeiros milagres, e acima de tudo, aguentou ser odiado durante 15 anos e mesmo assim continuou forte, a mostrar-me do que sou capaz quando acredito mais neste corpo e menos nas imagens utópicas que sempre viveram na minha cabeça.
Durante muitos anos eu desejei mesmo ter outro corpo.
Durante muitos anos negligenciei este corpo. Tratando-o da pior forma possível, dizendo-lhe as piores coisas do mundo e olhando para ele com desdém. E é por isso que hoje em dia eu procuro alimentar-me bem e treinar de forma consciente. É por isso que lhe dou ouvidos quando me pede descanso. E também é por isso que acordo às 6 da manhã para treinar quando lá fora chove e faz frio. É a minha forma de honrar este corpo, tornando-o mais capaz e mais saudável. Dando-lhe tudo o que precisa para mostrar o quanto é incrível.
No fundo escolher curar-me, comer bem e treinar, são a forma que encontrei de lhe agradecer por tudo o que aguentou. São acima de tudo, a forma de lhe pedir desculpa e prometer-lhe, que no que depender de mim nunca mais o vou tratar, como o tratei durante 15 anos.
Eu fui a pior inimiga do meu corpo, mas já não sou mais.
Catarina Vasconcelos
Querida Vânia… Emocionei-me tanto ao ler estas tuas palavras…a sério… és \”do caraças\” (e isto é um elogio muito bom cá no Norte eheheh)!!!
Beijinho gigante!!
vânia duarte
Catarina Vasconcelosopaaaaaaaaaaa <3 querida Catarina obrigada a sério pelo carinho 🙂
Ana
Nunca tive problemas tão sérios mas também tive (tenho) as minhas inseguranças. Já pesei mais 10kg do que o que tenho agora. Era adolescente e com 16/17 anos, em praticamente ano e meio, perdi os tais 10kg, essencialmente por uma mudança de dieta. Na altura foi uma vitória, mas deixou marcas – as estrias, para as quais ainda hoje evito olhar. Desde essa altura (e já passaram quase 10 anos) que mantenho o peso estável. E apesar de não desgostar do que vejo ao espelho, também não adoro. Felizmente sempre consegui que isso não tomasse conta da minha vida. Mas espelha-se nela: há certas roupas que não uso e, apesar de ir à praia e usar biquíni, faço-o com alguma vergonha (nem sequer tenho fotos minhas na praia!). Esforço-me por não me focar nesses pensamentos. Em direccionar-me para outros objectivos, mais do que ter o corpo de sonho (a minha britney spears era a jessica alba!). O objectivo é ser saudável e, tal como tu, é nisso que me concentro agora.
vânia duarte
AnaObrigada pela tua partilha .) A Jéssica Alba também é gira nas horas hehehehe 🙂 Acho que o importante é perceber que ninguém está feliz e se ama profundamente 24h por dia 365 dias por ano. E mesmo quando atinges os teus objectivos físicos há coisas que vamos olhar e achar que podemos melhorar sempre, isso faz parte e é OK, quando não nos condiciona a vida. um grande beijinho